Vitória, 00h10min, chove.
Fui até a varanda para ver esse milagre líquido, e lá nas ruas estava um menino correndo.
Despreocupado.
Sem camisa.
Alguém do apartamento ao lado grita que já não é hora de criança estar na rua.
Ele ignora o aviso, ignora a cidade, age e brinca nas poças de seu próprio mundo alagado. Eu observo, e me perco na aventura do menino que pula de poça em poça, esquecendo-se de carros, bares, pessoas, e some na esquina.
Lá se foi um personagem da chuva, e indo um, vem outro.
Um morador de rua passa cantando Chico, “Roda moinho, roda gigante (...)”, alheio a chuva que cai, ou ligado demais a ela.
Dobra esquina, sumindo na noite.
Permaneço na varanda, melhor entrar, transfigurar esses personagens em palavras. Isso não se aproxima da dedicação deles à água que lava a cidade, mas é o máximo que posso fazer. Fecho a porta.